O Tempo em Mim (Quando as Nuvens Dançam – Reflexões de Quarta-Feira)
Tem dias que adoro esse processo. Essa coisa de estar entrando na menopausa, tudo mudando por dentro e por fora. Os cabelos cada vez mais grisalhos, a imagem que flutua no espelho, vacila entre a menina, a mulher e a Anciã. Há muitos textos que falam do que é ser uma Anciã. Em culturas antigas, ela era reverenciada. Conta-se que ela era considerada a conselheira e contadora de histórias da tribo. Seus cabelos cor de prata eram um sinal de elevação e as rugas falavam do tamanho de sua experiência. Sabia-se que ela não precisava mais menstruar, pois havia incorporado a sabedoria da lua, entendia a morte como renovação em um nível celular e não precisava mais ser lembrada a cada mês. Sem dúvidas, envelhecer é tão intenso e interessante! Mas é claro que não é só isso.
Há altos e baixos, momentos nos quais sinto uma força incrível, que só a persistência, os anos e a contemplação profunda podem nos dar, e outros momentos nos quais entro em contato com vários medos e a crescente fragilidade que o envelhecimento traz. Um dia fomos crianças, adolescentes, jovens e o tempo passou. Por mais que a gente saiba que tudo muda, que agora vem outra coisa, ainda assim, é muito louco a gente se dissolver assim. Mesmo que fascinante, a transição não é fácil. Principalmente para as mulheres. Até numa questão tão simples como pintar ou não os cabelos. Em minha família, elas correm para o salão assim que os brancos despontam. Meus sobrinhos adolescentes incentivam minha irmã a pintar, não gostam de cabelos brancos. Minha cabelereira disse que acha que eles me “envelhecem”, como envelhecimento não fosse o que está acontecendo, mas depois ela se curva à minha curiosidade e me ajuda em mais uma autodescoberta. Meu marido me apoia quase sempre, mas às vezes me parece que ele, como eu também, tenta achar em mim aquela pessoa que eu era. Afinal, há momentos e dias nos quais eu mesma não me reconheço.
Não acho que seja errado pintar os cabelos, fazer plástica ou outros tipos de intervenções. O problema é o que nos leva a fazer essas coisas. Muitas vezes, a mensagem bem clara e direta, que nem precisa ser dita, mas pode ser sentida em todas as partes, é: envelhecer é ruim. Ser diferentes dos padrões de beleza é ruim. Temos que aceitar que vivemos em um mundo que associa velho com estragado e descartável. Sabedoria e experiência não contam, não têm valor no mercado das carnes, não se encaixam na produtividade crônica. Principalmente no que se refere a mulheres. Faz muito pouco tempo que recomeçamos a ter uma voz e a ser honradas pela totalidade do que somos, não só por nossa aparência, e acontece em pouquíssimos lugares do planeta. Por mais que digam o contrário, vivemos em um mundo de homens, onde a maioria das mulheres nem sabe que pensa como homens, pois a maior parte do que nos é ensinado, nossos livros e heróis e sistemas são masculinos. Não me entendam mal, honro e sou grata aos homens, mas acho que está na hora de reinventarmos esse mundo tão sofrido, começando por nosso mundo interior. Por mais difícil e doloroso que seja, algo me diz que envelhecer pode ser também belíssimo. Afinal, o mesmo mistério que opera silenciosamente na minha dissolução está também, diligente e incansavelmente, dissolvendo todo o resto.