28 – Ressonância  (Quando as Nuvens Dançam – Reflexões de Quarta-feira)

Em muitos anos de casamento, vivemos todas as bonanças e intempéries, toda a maravilha e todo o horror que somos — refletidos na forma como nos relacionamos, como sentimos, como agimos e reagimos diante do abismo que é o outro.

O amor que permanece não aceita nada menos do que a rendição total: morrer e renascer diferentes, quantas vezes for preciso. É necessário se render à verdade de que o outro sempre será um enigma — e é nesse processo de aceitar o mistério do outro que nos aproximamos, enfim, da nossa própria humanidade.

No início, tentamos moldar o companheiro aos nossos sonhos, valores e expectativas. Mas cedo ou tarde, nos frustramos diante dessa meta irrealizável. Essa frustração nos leva a encruzilhadas duras: partir ou recomeçar ali mesmo, exatamente onde estamos — mas deixando ir tudo o que foi. Relacionamento, como arte, se nutre de fracassos elaborados e de recomeços criativos.

Lembro de ter dito, um dia, que adoraria ver a arte de Florencio além dos limites da forma. Como seria a versão abstrata e livre de conceitos do homem que eu amo? Como traduzir, com as próprias cores, o que pulsa no invisível?

Florencio foi além. Superou as expectativas — as minhas e as dele mesmo. Transbordou. Lançou-se, sem medo da perda de controle, no desconhecido. E ao fazê-lo, pintou portais de encantamento nas paredes da realidade.

Nada é mais transformador do que renunciar aos pensamentos estreitos e abraçar a vastidão de quem somos. Só a verdadeira arte tem esse poder: o de nos elevar para além da nossa mortalidade.

Parabéns, meu amor. Por tua coragem, tua entrega, tua beleza. Que todos vejam, nesta exposição, o milagre de um homem que ousou transformar-se inteiro.

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