
Para quem quer avançar, o primeiro passo é sempre olhar para si e admitir: admito que não sei. Sou uma escritora que não sabe escrever, uma praticante de meditação que não sabe meditar, uma tradutora que não sabe traduzir, uma ativista que não sabe lutar, uma capoeirista que não sabe jogar, uma esposa que não sabe amar, uma mãe que não sabe maternar, uma filha que não sabe cuidar da mãe, um ser humano que não sabe existir. Saber disso me faz chorar, um choro doído, como quando eu era criança, recebia um não e acabava soluçando dramaticamente por tudo de triste em que podia pensar. Não consigo mais fazer isso, é muito raro, mas a sensação é a mesma. Talvez eu tenha simplesmente medo e não me permita mais sentir esses sentimentos absolutos. Medo de sentir e admitir para mim mesma, total e profundamente, que ainda sou aquela criança sem noção.
Olho em volta e vejo pessoas que sabem coisas, sabem bem mais do que eu, o que me faz admirá-las. Elas se orgulham disso, se apropriam de seus saberes e exigem o respeito merecido pelo árduo trabalho envolvido em tanto conhecimento. Mas há também uma grande massa de pessoas como eu. Pessoas que não sabem. E há ainda uma maior parcela de pessoas, a maioria talvez, que acham que sabem, mas não sabem. Essas, sim, podem ser perigosas. É claro que quase todo mundo sabe nem que seja o básico, como se levantar todas as manhãs, tomar banho, escovar os dentes e se vestir. Não parece, mas essas coisas já exigem imenso empenho em um mundo em que a vida vale tão pouco. Quem alguma vez sofreu um acidente ou uma depressão percebe que não é evidente saber dessas coisas. Há um esforço desmedido envolvido em simplesmente viver, um conhecimento de fundo necessário, mas não óbvio, por mais natural que seja. Por isso, custa tanto escolher ser o que somos.
Não sabemos quase nada e não há importância alguma no que fazemos, ao mesmo tempo que, enquanto estamos fazendo, nossas decisões são tudo para nós e têm grande importância, já que estamos no mundo e o mundo está em nós. No final das contas, caminhar é a escolha do próximo passo, da próxima pincelada ou palavra a ser digitada, da confiança ou desconfiança com que enfrentamos a tela em branco. A gente avança quando abraça a oportunidade contida no instante, sem julgamentos ou expectativas, quando escreve e se reescreve o tempo todo na tentativa de navegar a existência, em um barco suspenso no vazio, com um coração que sangra no peito. A maior decisão é sempre agora, entre seguir com a tristeza de quem perdeu o rumo ou a gentileza de quem está, a cada momento, reaprendendo a sonhar.